O espaço em que vivemos é coletivo, colaborativo. Tudo acontece na cidade em que vivemos, no território municipal. Em uma declaração muito feliz, a prefeita de Barcelona, Ada Colau, disse: “Todos os grandes desafios globais — mudanças climáticas, a economia, desigualdades, o próprio futuro da democracia — serão resolvidos nas cidades”. É uma verdade se pensarmos em quantos de nós busca o governador para resolver problemas na nossa rua, no nosso bairro, na nossa comunidade? Os estados são linhas políticas de divisão, mas que não contém um território, pois o território é municipal. Os estados congregam as cidades que o compõe.

A publicação brasileira Nexo, uma iniciativa de jornalismo independente, lançou uma matéria falando sobre a origem, o poder e as dificuldades das cidades no Brasil. A grande questão é que o Brasil se transformou de nação rural a sociedade urbana em algumas poucas décadas. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas, de 1950 a 2010, a população que vive em cidades passou de 36,1% a 84%, assim como o número de cidades com mais de 250mil habitantes passou de 63 para 99. A média mundial de pessoas vivendo em áreas urbanas passou dos 50% em 2010, portanto o crescimento da população urbana brasileira está acima da média. Este dado ajuda a explicar a grande quantidade de problemas urbanos que nossas cidades acumulam.

Muitas cidades seguem crescendo, mas algumas estão perdendo população. No passado o êxodo rural era o principal motivador do crescimento das cidades. As pessoas buscavam emprego e serviços de saúde e educação diferenciados. Por isso o número de municípios foi crescendo e muitas emancipações ocorreram.

O que gera bastante discussão ainda em torno das cidades são questões desde mobilidade urbana até partilha dos tributos no pacto federativo. Segundo o Artigo 18, da Constituição Brasileira, municípios podem ser criados, fundidos e desmembrados por lei estadual e mediante plebiscito feito com as populações envolvidas. Esse processo demanda estudos de preservação e continuidade territorial, para que um município não seja interrompido em terra por outra unidade.

No Brasil, os municípios mais novos datam emancipação em 2013, mas o que atormenta municípios menores é a falta de renda e emprego. A consequência é que aquele território passa a depender bastante de repasses federais. É preciso que as cidades produzam economia mínima para auto gestão. Em 2018, uma pesquisa apontou que no Rio Grande do Sul, metade dos municípios, 56,7% não geram receita suficiente para custear a estrutura da máquina pública. Na minha opinião isso deveria ser revisto em alguns locais. Em Caxias do Sul por exemplo, município do RS, há uma negociação que parte do município vizinho São Francisco de Paula seja anexado ao território caxiense. Motivo: as pessoas do povoado de Cazuza Ferreira estão mais vinculadas a Caxias do Sul do que ao município mãe que tem um território gigante. Mesmo com os tributos que gera e com os repasses, São Francisco de Paula não tem condição de atender o povoado de Cazuza Ferreira.

É nas cidades que se se testam políticas públicas. Por exemplo, em Cingapura nos anos 70 e Londres nos anos 2000, foram introduzidos pedágios urbanos. Isso depois acabou tomando proporções nacionais. Eu acredito que cada vez mais os problemas que as cidades enfrentam será a cargo do Prefeito e de sua população. Que a gerência do governador será reduzida a questões de maior escala como a segurança pública. Acredito também que a Lei Federal que institui as regiões Metropolitanas promoverá ainda mais a descentralização da gestão, pois o principal objetivo é a viabilização de sistemas de gestão pública de interesse comum aos municípios abrangidos, além de engrandecer a área.

Citando outra frase interessante, esta dita pelo ex-prefeito de Londres, Ken Livingstone: “Em todo o mundo, frequentemente, são as cidades que iniciam a mudança antes dos governos nacionais, principalmente nos países com forte presença do governo regional, como a Alemanha e os EUA”. Ou seja, as cidades e a sociedade civil devem protagonizar o processo de transformação urbana. Seus problemas serão solucionados a partir disso. Somente com organização, monitoramento e planejamento de pequeno, médio e longo prazo que teremos as cidades que precisamos. O ecossistema urbano é o acolhedor de negócios e investimentos. É preciso criá-lo e potencializá-lo.

Os atores urbanos serão protagonistas deste processo e núcleos urbanos se formarão independente da divisão de bairros. Aliás, acredito que a divisão de bairros servirá apenas para endereço e que as novas centralidades urbanas perpassarão estas divisões e se fortalecerão em torno das condições urbanas favoráveis a geração de negócios.

É nas cidades que as grandes transformações acontecem